quinta-feira, maio 21, 2009

Fotografia/Náutica: Mar de Dentro II. Uma Noite no Porto do Barquinho

Voltando ao tema Lagoa dos Patos, posto algumas das minhas fotos preferidas, captadas todas durante viagem de retorno do Veleiro Arraia Manta (VDS) de Rio Grande para Porto Alegre após participar do I Cruzeiro-Regata Almirante Tamandaré no final de abril de 2007.

Como neste retorno não tínhamos a pressa da ida, viemos em ritmo de cruzeiro, costeando a margem leste da Lagoa dos Patos em alguns dos trechos em que ela é mais bonita. Uma das paradas foi no Porto do Barquinho, na foz de um pequeno arroio, cerca da cidade de Mostardas, a 66 milhas náuticas de Porto Alegre e um verdadeiro paraíso para observadores de avifauna e fotógrafos.

Na medida em que se ultrapassa os molhes que remanecem de uma obra inacabada dos anos 40, tendo o campo pelos dois costados do barco, entra-se aos poucos pelo arroio até onde ouver calado. O barco fica encostado na barranca e a gente salta direto em terra.

É muito comum topar-se com capivaras, famílias de emas, tatus, cágados e uma infinidade de aves. Quem olha o barco um pouco de longe a partir da terra, tem a impressão de que está vendo uma miragem com um mastro em pleno campo na medida em que não se consegue enxergar o arroio.

O curioso na sequência de fotos que segue é que elas foram todas captadas em uma única oportunidade, num período aproximado de 14 horas de intervalo, iniciando às 18h00 de um dia e avançando até às 10h00 da manhã seguinte.

A um crepúsculo de cores exageradas (bem ao estilo "Edições Paulinas com diz meu amigo Danilo "Popa" Chagas Ribeiro), seguiu-se uma noite límpida, com o céu forrado de estrelas.

Gosto destas duas cenas abaixo. Elas me remetem diretamente ao clima de absoluta celebração da vela como atividade de lazer e de mínimo impacto junto ao ambiente natural. O frio que chega com o entardecer, as gaiútas já molhadas do sereno e o velejador recolhendo-se à cabine preparando-se para as fainas do jantar.

Na falta de um tripé, a foto do Arraia Manta fundeado sob o céu estrelado foi tirada com a câmera apoiada em terra sobre um caixa de isopor que cheirava terrivelmente a camarão. Me disse o Danilo que esta imagem representa para ele todo a essência e o ideal da vela de cruzeiro, serena, silenciosa, integrada de forma plena ao coração da mãe natureza.

Na madrugada uma névoa fria cobriu o arroio e assim foi até o raiar do sol. O sereno cobriu de cristais as teias de aranha e os aguapés que cercavam o veleiro.


O retrato fantasmagórico do Arraia Manta fundeado em meio à neblina vai aos poucos sendo colorido com uma paleta inteira de cores quentes como efeito da refração dos raios de sol que começam a dissipar a cortina de névoa.

Confesso que captar esta sequência de imagens me deu um bom trabalho. Primeiro porque embarcado eu não tinha um tripé para fixar a câmera nas condições de baixa luminosidade. Segundo, porque para seguir o ciclo de luzes e cores precisei transnoitar com um olho aberto e outro fechado, cuidando as mudanças de luz e textura da neblina.

O que só confirma o dito que uma boa obra resulta de 10% de inspiração e 90% de transpiração...

O ciclo de cores inicia pelo cinza, segue o lilás, amarelo e de novo se fecha com o laranja na medida em que os primeiros pescadores descem o arroio rumo à Lagoa dos Patos, guiados pelo enorme globo alaranjado em meio à névoa da manhã.

Estas imagens foram captadas com uma câmera Canon EOS-1D, jogo de lentes 20 a 300mm, no pernoite 28-29 de abril de 2007.

segunda-feira, maio 18, 2009

Canionismo: Aparados da Serra, de Pai para Filho (Ou: acampando com crianças!)


Vista desde o vértice pricipal do Cânion Malacara - PNSG

No último final de semana a oportunidade foi única: uma permissão especial do Instituto Chico Mendes para acesso ao Cânion Malacara, que divide com o Cânion Fortaleza a condição de principal atração do Parque Nacional da Serra Geral - PNSG, divisa dos Estados do Rio Grande do Sul com Santa Catarina.

O motivo: a condução de uma equipe do Programa Adrenalina para a produção de um documentário sobre canionismo para o Canal Futura, da TV Globo Internacional, mostrando uma travessia completa do famoso e complexo Cânion Malacara.

Numa sexta-feira à noite partimos de Porto Alegre rumo ao município de Cambará do Sul/RS, onde está situada a parte alta do parque, em pleno altiplano riograndense, para lá encontrar a equipe de produção do programa, a qual seria conduzida por outro caminho, à pé e valendo-se de cavalos para o transporte do equipamento mais pesado.

Em uma sexta-feira à noite partimos de Porto Alegre. No destaque o saudoso Zé Brambilla, parceiro insubstituível de várias aventuras nos Aparados da Serra.

Por volta da meia-noite o caminho regular terminou. Então, montar acampamento e descansar antes dos trabalhos do dia seguinte.

Alguns dormiram confortavelmente...

...como se estivessem em casa.

Outros, por opção...

...preferiram bivacar ao relento, na boa companhia dos demais habitantes nativos.

Alguns anos depois de ter participado da equipe de levantamento que coletou dados topográficos e geológicos relacionados à prática de canionismo e que integraram o Plano de Manejo do PNSG, voltamos à carga com todo o ânimo.

O desafio era encontrar um antigo caminho que o desuso decorrente da criação do parque nacional fez com que desaparecesse em meio a capoeiras, plantações de pinus e propriedades particulares contíguas ao parque nacional.


   
O uso combinado de cartas topográficas, tracklogs e imagens satelitais sobrepostos foi essencial para a localização de estradas há muito desaparecidas.
Redescobrindo antigos caminhos com mais de meio século que a natureza retomou...


Com fotos de satélite, tracklogs de GPS coletados em levantamentos passados e cartas topográficas, todos sobrepostos no aplicativo OziExplorer, fomos navegando em 4x4 por entre coxilhas, charcos, vossorocas e capões de araucárias, atingindo com trabalho em equipe e muito esforço o objetivo final.

Atravessando as fazendas vizinhas ao Parque Nacional da Serra Geral com o auxílio de mapas antigos, imagens de satélites e tracklogs de GPS
Ao final da tarde chegamos ao vértice principal do Cânion Malacara.

O prêmio é pródigo, principalmente para mim que estou de aniversário: um dia maravilhoso, límpido, com aquela luz outonal, meio atravessada, perfeita para quem gosta de jogar com sombras na fotografia. A atmosfera foi lavada da nebulosidade por uma chuva forte acompanhada de queda brusca de temperatura a 0ºC.

Nada de melhor poderia desejar alguém em busca das condições ideais para foto e filme!



Quem acha que acampar é sinônimo de sofrer está muito enganado!

Até porque convidados VIP tem direito a quibe crú, molho de alho, pão árabe e suco de uva servido pelo mais esforçado dos cozinheiros: Neytão "Montanha" Reis, que não por acaso é o melhor guia para os cânions do sul do país!!

A noite é fria, muito fria, com temperaturas abaixo de zero. Ao amanhecer um vento forte penteia os campos de cima da serra e anuncia o raiar do dia. Quem vai descer o Cânion Malacara com a equipe de gravações levantou ainda de madrugada e está lutando para vestir as gélidas roupas de neoprene. Da minha barraca só escuto gemidos e resmungos daqueles que vão para o front...

Como responsável pela logística 4x4 já fiz minha parte e não vou entrar no cânion desta vez, também porque acompanho as crianças. E, como sou aniversariante, me dou o prazeroso luxo de virar para o lado e curtir a preguiça no saco de dormir até que o sol bata na barraca e, pelo menos, derreta a geada...


Quem diz que em pleno vértice do Cânion Malacara não tem tele-entrega do jornal do dia?

Para animar a galera antes de pular na água gelada vale tudo, até a dança do sirí!

Os gêmeos entram no  clima com Ana Karina Belegantt, do Programa Adrenalina. Futuros canionistas?

Cânion Malacara, em segundo plano o município catarinense de Praia Grande e, ao fundo, a praia de Torres/RS.


Embaixo, ao sopé da serra, o município catarinense de Praia Grande e, bem ao fundo, a praia gaúcha de Torres.

A atração irresistível que sinto por esta região vem de anos.

A minha primeira travessia de cânion foi a do Itaimbezinho, hoje proibida, por volta de 1980, quando não existia qualquer tipo de restrição para quem quisesse aventurar-se por esta enorme garganta, palco de muitos acidentes e gente extraviada.

Depois dela nunca mais deixei de retornar aos Aparados da Serra, culminando com a militância voluntária na ONG Associação Cânions da Serra Geral - Acaserge desde 1998. A grande diferença é que desta vez não voltei aos Aparados sozinho, mas trouxe para a primeira aventura verdadeira meus filhos gêmeos, com 7 anos de idade.

No acampamento em área selvagem, dentro do parque nacional tudo é diversão. A emoção e o entusiasmo não poderiam ser maiores, a inocência da idade relembrando ao pai o be-a-bá das lições mais elementares:

"- Papai, o que é um Parque Nacional?
- Onde estão os animais?
- Porque o cânion é tão fundo?
- Porque faz tanto frio?
- Tem urso aqui? E tigre?
- Lá embaixo é a praia de Torres?
- Dá prá beber essa água? 
- Vamos tomar banho no rio?
- Onde eu faço cocô?..."



Vista do Cânion Malacara a partir da sua escarpa direita.



Matinha nebular, típica dos paredões dos Aparados da Serra.


Pelo lado paterno reza a história familiar que meu bisavô Januário foi tropeiro nos Campos de Cima da Serra, estabelecido em Cazuza Ferreira, distrito de São Francisco de Paula/RS. Baixava a serra em mulas e cavalos rumo ao litoral levando charque, queijos e embutidos e voltava com farinha, melado e rapadura.

Do lado materno, a herança italiana nascida em Antonio Prado também fincou raízes em São Chico, onde meu avô materno elegeu-se prefeito nos anos 50.

A carga genética fez então valer toda a sua força, transmitindo mais uma vez, de pai para filho, de geração para geração, a seiva de araucária nas veias e uma incondicional paixão pelos Campos de Cima da Serra...


O diário da aventura na ótica de JPL, 7 anos...
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Assista aqui o episódio do Programa Adrenalina gravado durante as atividades descritas nesta postagem!


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OUTRAS POSTAGENS RELACIONADAS AQUI NO TERRA AUSTRALIS:

- 30/09/2010 - Trekking/Aparados da Serra: Do Cânion Fortaleza ao Malacara - Parque Nacional da Serra Geral

- 10/01/2011 - Aparados da Serra/Canionismo: Mistério - Corpo é encontrado no Cânion Itaimbezinho


domingo, maio 10, 2009

Náutica: Velejando de Porto Alegre a Tapes



A Regata-Cruzeiro Porto Alegre-Tapes, retrilhando a antiga Rota do Arroz, chega com sucesso à sua terceira edição após resgatada por um grupo de velejadores pouco tempo atrás.

A largada se dá numa sexta-feira marcada por um daqueles crepúsculos magníficos que só o porto-alegrense da gema sabe o que significa. São mais de 60 milhas náuticas no trajeto POA-Tapes em dois dias de navegação parcial, incluindo um já clássico pernoite na Praia do Sítio, na Reserva Ecológica de Itapuã. A pequena baía se transforma em uma pequena cidade flutuante onde a confraternização entre os barcos ecoa por uma noite magnífica.

Pôr-do-sol no Rio Guaíba visto do Clube Veleiros do Sul, em Porto Alegre. Foto João Paulo Lucena





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Ao despertar do sábado, véspera do Dia das Mães, mais de 50 embarcações partem em meio a neblina para a segunda e última perna do percurso, adentrando à Lagoa dos Patos sob a severa guarda dodo Farol de Itapuã.





Com a falta de visibilidade e o vento quase inexistente a navegação é feita por instrumentos e o que importa agora não é mais chegar na frente, mas sim participar e concluir o percurso.

No meio da tarde os barcos começam a chegar no fundeadouro do Clube Náutico Tapense, onde um um sol gostoso recebe a todos trocando o preto-e-branco da passagem pela Lagoa dos Patos pela característica profusão de cores das marinas no mundo inteiro.



Para mais informações e imagens sobre a III Regata-Cruzeiro Porto Alegre-Tapes vide http://www.popa.com.br/_2009/EVENTOS/POA-TAPES/noticias_poa-tapes_16mai09.htm.