sexta-feira, janeiro 14, 2011

Surfe: Pescadores x Surfistas - Lei estende zonas para prática de surfe no Rio Grande do Sul e determina o uso de equipamento de segurança

Praia da Guarita - Torres/RS

Procurando regular um antigo conflito entre pescadores e surfistas nas praias do Rio Grande do Sul, onde 49 praticantes deste esporte já morreram presos em redes de pesca desde 1978, foi publicada hoje no Diário Oficial do Estado a sanção do Governador Tarso Genro à lei que estende, de 400 metros para 2,1 quilômetros as áreas de surfe no litoral gaúcho.

A lei não se limita ao surfe mas determina a obrigatoriedade da demarcação das áreas de pesca, lazer ou recreação, nos municípios com orla marítima, lacustre ou fluvial e originou-se do Projeto de Lei nº 113/2010, do Deputado Fernando Záchia.

Embora atendendo à reivindicação dos surfistas, o projeto repercutiu negativamente entre pescadores e o Ministério da Pesca, uma vez que, para os primeiros, a nova regulamentação inviabilizará a pesca familiar e gerará desemprego.

Pesca de tarrafa no Rio Mapituba - Torres/RS
Temos aí a necessidade de ponderação entre dois valores ligados à vida: de um lado a proteção aos surfistas que exercitam o seu direito de acesso ao mar para prática de um esporte e lazer; de outro os pescadores que tiram do mesmo mar a sua subsistência.

Quem tem razão? Será que não há espaço para todos?

O certo é que os pescadores continuarão e os surfistas a surfar...

Praia Grande - Torres/RS
Como as áreas de surfe devem ser demarcadas em zonas urbanas, os pescadores afirmam que é justamente nela em que historicamente criaram raízes e que é do mar que retiram a sua subsistência e de suas famílias.

Resta saber como vai ser feita a demarcação.

Aqui do meu lado fiz algumas simulações...

O litoral do Rio Grande do Sul possui 622 quilômetros de extensão, o que , hipoteticamente, seria suficiente para criar 296 áreas contínuas para prática de surfe. Já o chamado litoral norte do Estado possui 112 quilômetros, possibilitando 53 zonas exclusivas de surfe lado a lado.

Por sua vez na extensão de litoral total do Rio Grande do Sul temos apenas 17 municípios: Torres, Arroio do Sal, Terra de Areia, Capão da Canoa, Xangri-lá, Osório, Imbé, Tramandaí, Cidreira, Balneário Pinhal, Palmares do Sul, Mostardas, Tavares, São José do Norte, Rio Grande, Santa Vitória do Palmar e Chuí, o que contabilizaria apenas 35,7 quilômetros de litoral bloqueados para a pesca.

Ainda, considerando que nos 112 quilômetros do litoral norte são apenas 10 municípios, calculando uma zona de surfe por cada um teríamos 21 quilômetros para os esportistas e 91 para os pescadores.

É claro que nestes municípios existem as respectivos praias e balneários e que somam várias centenas por todo litoral.  Todavia a lei refere que os municípios é que deverão criar estas zonas de exclusão para pesca, não deixando claro se será uma para cada município ou para cada praia e balneário.

Somente Arroio do Sal conta com 48 balneários.

A Praia da Guarita em Torres é tradicional ponto de surfe no RS
Praia da Guarita - Torres/RS
Praia de Itapeva em Torres. Outro ponto onde se mesclam pescadores e surfistas

A nova lei também estabeleceu como obrigatória a utilização de equipamentos de segurança por parte dos surfistas, não especificando o tipo a ser adotado.

Mas que equipamento é este?

Que eu saiba as agremiações surfistas como a própria Federação Gaúcha de Surf não costumam recomendar a adoção de qualquer equipamento de segurança individual para os surfistas (na data de hoje não constava nada no saite), mesmo que isto já tenha sido adotado em esportes náuticos que também exigem grande liberdade de movimentos pelos seus praticantes. Assim é o caso da vela em monotipos, o kitesurf, o windsurf, o wake board, o tow-in, o ski aquático e tantos outros.

Aproveitando minha vivência em outras atividades, a título de exemplo, e tratando de proteger a sua própria vida, porquê um surfista não poderia usar como equipamento de segurança um pequeno canivete para cortar redes, lashes e cordas - como se usa no canionismo, na escalada e no mergulho - ou um colete salva-vidas inflável, como alguns modelos minimalistas adotados na vela e que sequer se consegue sentir quando estão vestidos?


Colete salva-vidas inflável para atividades que exigem grande liberdade de movimento.
Fonte: Marine MegaStore

Recentemente a Mormaii desenvolveu de trajes de neoprene para tow-in e wake board com colete salva-vidas incorporado e há pouco tempo atrás vi no noticiário gaúcho sobre o desenvolvimento de um um traje para surfe com dispositivo de segurança inflável e que também poderia ser usado como suprimento de ar de emergência.

Se é confortável, não sei, mas você usaria se ele pudesse salvar a sua vida?


Wetsuit para tow-in com colete salva-vida incorporado. Fonte: Mormaii
Wetsuit com flutadores salva-vida incorporados para wakeboard.
Fonte: Mormaii

Segundo a lei gaúcha, que já está em vigor, se aplica a todos sem exceção e representa uma tremenda conquista em prol da proteção à vida, estão definidas responsabilidades para pescadores e surfistas, cabendo a cada lado assumir a sua parte, tanto no que toca ao bônus de ter áreas reservadas para surf, quanto ao ônus do uso de equipamento de segurança individual para os últimos.

Veja aqui o texto integral da nova Lei 13.660/2011, publicada no Diário Oficial 010, de 13/11/2011, p. 1 e que, a propósito, consta com erro de publicação da data ao seu final pois, onde deveria constar o ano de 2011, originalmente constou 2010... (** equívoco já corrigido...)

"Altera a Lei n.º 8.676, de 14 de julho de 1988, que determina a obrigatoriedade de demarcação das áreas de pesca, lazer ou recreação, nos municípios com orla marítima, lacustre ou fluvial.

O GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL.

Faço saber, em cumprimento ao disposto no artigo 82, inciso IV, da Constituição do Estado, que a Assembléia Legislativa aprovou e eu sanciono e promulgo a Lei seguinte:

Art. 1º - O art. 1.º da Lei n.º 8.676, de 14 de julho de 1988, que determina a obrigatoriedade de demarcação das áreas de pesca, lazer ou recreação, nos municípios com orla marítima, lacustre ou fluvial, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 1º - Os municípios que em seu território tiverem praias banhadas por lagoas ou rios deverão demarcar, nas áreas centrais de todos os seus balneários, no prazo de 60 (sessenta) dias, numa extensão de 450m (quatrocentos e cinquenta metros), os locais destinados aos desportos de diferentes modalidades, à recreação e ao lazer em geral.

§ 1º - Para os municípios que possuem em seu território praias banhadas por mar, a extensão mínima para a demarcação referida no “caput” deste artigo será de 2.100m (dois mil e cem metros).

§ 2º - Nas áreas mencionadas neste artigo, fica proibida a pesca profissional com redes, excluindo-se desta proibição a pesca amadora, praticada com linha de mão e caniços.

§ 3º - Para a prática do “surf” fica obrigatório, em todo o território do Estado do Rio Grande do Sul, o uso adequado de equipamento de segurança.

§ 4º - A Defesa Civil do Estado prestará informações, pelos meios de comunicação, quando as condições metereológicas não forem recomendadas para a prática do “surf”.

§ 5º - Caberá aos órgãos públicos competentes a sinalização das áreas referidas no “caput” deste artigo.”

Art. 2º - Esta Lei poderá ser regulamentada no prazo de 60 (sessenta) dias a contar da data da sua publicação.

Art. 3º - Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

PALÁCIO PIRATINI, em Porto Alegre, 12 de janeiro de 2011."

PARA SABER MAIS:

- Lei 13.660/2011 - Fonte oficial
- Clic RBS - Lei amplia áreas para surfe no Estado. Prefeituras terão 60 dias para seguir nova determinação
- Jornal Correio do Povo - Lei que amplia áreas de surfe leva pescadores a buscar ajuda em Brasília. Categoria avalia que 2 mil pessoas correm o risco de ficar sem trabalho
 - Assembléia Legislativa do RS - Aprovado projeto de Záchia sobre demarcação nas áreas de pesca, lazer ou recreação


IMAGENS:

Todas as fotografias são de autoria de João Paulo Lucena. Direitos reservados. Equipamento utilizado: Canon EOS-1D Mk II, lente zoom 100-400 e teleconverter 1.4.

Um comentário:

  1. Ótima matéria ! Ja esta na hora de acabar esse problemas com pesca de cabo fixo. Esse tipo de pesca não pode mais existir. Compromete e a segurança de surfistas e banhistas. É um tipo de pesca predatória.

    Parabens

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